Não sei.

Entra no carro.
Silêncio.
Ela sentada calada, olhando fixamente pra frente quase sem respirar.
Parecia pintura.
A pouca luz que vinha do lado de fora do mundo insistia em bater em seu rosto e fazer seus olhos parecerem mais claros do que realmente são.
Pernas a mostra. Saia curta beijando a coxa. Mãos suando.
Ele com a chave na mão. Sentado no banco do motorista. Tinha um sorriso besta na boca.
A olhava como carne no açougue. 
A mão foi na coxa beijada pela saia.
Uma reação de quem não espera o pior.
Um curto salto do banco e uma respiração desesperada se fazia ouvir da outra esquina.
Ela desceu do alto e ficou cara a cara com o inferno.
A mão deslizou pela perna.
Ela fechou os olhos.
Ele sorria mais ainda.
Ela sabia.
Ele insistia.
Calcinha de renda preta.
Pôde então ver que seu mundo queimava em pequenas fagulhas atiradas ao inferno uma por uma.
Guardou a reza pra mais tarde.
"Vamos descendo em cada curva perigosa desse seu corpo, mulher."
Sentiu-se então a sereia da praia dos sonhos. 
Teu corpo era sagrado. 
Nele agora havia um fiel fazendo tua prece de joelho entre as pernas beijadas não mais pela saia que já estava deitada no banco de trás.
Recostou-se ao banco.
Ele fazia certos malabarismos para tocá-la.
Ela via pela janela embaçada do carro que o mundo lá fora era tão desinteressante quanto uma música qualquer tocada em estação de rádio velho.
Decidiu se dividir entre o céu e o inferno.
Ele fala alguma coisa.
Ela não ouve.
Ele fala alguma coisa de novo.
Ela responde com o olhar que derruba impérios.
Suas pernas tremiam. Não sentia o chão e isso dava medo.
Ela via dali seus sonhos do lado de fora da janela num mundo desinteressante.
Abre a porta do carro.
"Tira a mão".
Ele tirou.
Ela saiu.
Deixou a calcinha pra trás como se fosse uma dignidade cuspida.
"Tenta um pouco mais na próxima."
Saiu.

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