Fala

Fala.
Tu bem sabe que tua reza é fraca
quando tua mente é suja.
De nada adianta juntar os pés em prece 
se não erguer a cabeça em devoção.
Nestes tempos mais frios eu bebi todos os vinhos que pude.
Procurei a benção,
ergui as mãos em loucura
e encontrei a tentação.
Esqueci de rezar,
não joguei promessas no mar
e pulei dezenove ondas.
Dezenove ondas a desejar.
Em todas elas desejei teu eu. 
Os santos daqui me expulsaram de casa,
e Maria ainda quis me fazer graça,
e te trouxe aqui.
Vem cá.
"Me abraça?" 
Te pergunto.
"Te abraço!".
E me veio num pulo,
no susto.
Teu abraço não tem mais cheiro de cerveja.
Nem gosto de nostalgia.
Mas um dia fora,
e eu podia
viajar nele.
Eu vejo que suas mãos descem chorando pelas minhas costas.
Elas vão cansando pelas curvas deste corpo que tu conhece melhor que eu.
Este corpo meu que é mais teu.
Ainda mais teu,
que meu.
"Me abraça." com cheiro de desgraça.
Desfaça.
Arrasta.
Saia.
Pegue aquela taça,
jogue a faca,
se entrelaça
entre os santos das minhas pernas magras.
Chuva que chove em mim,
como se não houvesse terapia pra desfazer os planos já prontos e jogados no mar.
Mas eu vou cá te falar,
essa tua insanidade me estraga.
Não há mais espaço aqui pra não se falar o que quer falar.
Ou tu fala,
ou cala.



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