A menina

A menina queria apenas ser legal. Uma pessoa bacana e bonita. Aquela menina que encanta a todos com os olhos doces feito mel.  Aquela que é tão inteligente que poderia ser professora. De filosofia, é claro! Essa menina adora filosofia. Pensava em fazer teatro também. Poder fingir ser mais legal sem incomodar ninguém. Aquele lance de interpretar papéis na cara dura e não se incomodar por isso. A menina queria apenas deixar de ser invisível. E ela tentou. Ah, e como tentou. Tentou fazer algo com que se destacasse, e então começou a escrever. Escrevia bem, talvez. Escrevia para ela mesma, mas a menina não se importava e até gostava se alguém lia o que escrevia e achava legal. Afinal, era para isso que escrevia. Para ser legal. Só não era bonita, mas ás vezes era legal.

Seus amigos mais próximos dizem que a menina é sensível. Completamente emocional. Talvez seja. Mas ela só queria ser legal. Ela foi ao Teatro certa vez. O nome da peça era “O Velório”. E ela achou tão legal. Ela queria ser legal da mesma maneira como aquilo foi legal. E foi bonito. E ela queria ser bonita da mesma maneira que aquilo. Mas achava a vida louca. Ela não sabia explicar as coisas. Mas como isso? A menina queria ser professora! Professora que não sabe explicar as coisas?
A menina era sonhadora. Até demais. Até os mais sonhadores diriam que ela sonha demais. E o pior: ela sonha acordada.

A menina já amou algumas vezes. Quer dizer... Diz ela que já. Mas nunca foram amores legais. E ela só queria ser legal. Foram amores bonitos, indecisos mas não recíprocos. E isto não é legal.
Até que ela sonhou conhecer um cara. Talvez o grande amor de sua vida. Putz! Que menina indecisa. E nele tornou a pensar.

Não pode ser amor, mas a menina amava sua barba. Não pode ser amor, mas a menina amava aqueles olhos. Não pode ser amor, mas a menina amava aquele sorriso. E amava demais. Não pode ser amor, mas a menina amava aquele amor. E ela só queria que fosse legal. Mas não queria que fosse amor.
A menina sonha demais. Ela não tem razão. Ela se deixa levar fácil, é só segurar sua mão. Mas a menina tem medo. E ela só queria ser bonita. E ela tem medo de nunca ser bonita. E ela tem medo de nunca ser legal. Mas os dias vão se passando e ela continua querendo ser legal.

Cansada de tudo, ela dorme.
A menina adora dormir. Mas dormir sozinho é triste. E isto não é legal. Dormir bagunçada numa cama estreita com um barbudo sem camiseta é legal. É bonito.
Mas a menina só escreve e não vive. Ela não dorme com o cara barbudo sem camiseta. Muito menos tem uma cama estreita. Não nem tem quarto. E está chovendo. A chuva a faz pensar mais. Sonhar mais.

Ela dorme e acorda. Sozinha ainda. Caminhando pelas ruas da cidade, ás vezes tristinha, porque ela só queria ser legal, e quem sabe bonita.

Comentários

  1. Nossa, se mudar alguns minimos detalhes essa seria a minha historia.
    Acho que muitas pessoas se sentem da mesma forma.

    ResponderExcluir

Postar um comentário